publicado a: 2018-06-04

Em Portugal já se criam insetos para alimentação humana

O Agrozapp esteve à conversa com o Guilherme Pereira, fundador da Portugal Bugs, uma start-up sediada em Matosinhos, focada na criação e processamento de insetos para alimentação humana e animal.

Agrozapp (A): Como surgiu a ideia?

Guilherme Pereira (GP): Bem, toda esta ideia surgiu na Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, no terminar do curso de Ciências de Engenharia – Perfil Engenharia Alimentar, quando no último ano de licenciatura foi proposto desenvolver uma barra energética à base de proteína de inseto, pelo professor Luís Miguel Cunha, e este projeto foi aceite por mim, Guilherme Pereira, um dos fundadores.

O que levou a aceitar este projeto, foi o facto que desde cedo havia o interesse de tornar este projeto universitário num projeto empresarial.

A: O que o levou a apostar em insetos?

GP: No decorrer do meu projeto de fim de curso, comecei a investigar um pouco mais sobre os insetos, e desde aí fui descobrindo características tanto nutricionais como ambientais que me deixaram entusiasmado com este ramo.

Para além disso em 2012, a FAO (Food and Agriculture Organizations for United Nations) lançou a polémica sobre o tema dos insetos ao questionar como iriamos conseguir alimentar 9,7 mil milhões de pessoas em 2050, sugerindo que essa solução passasse pelo consumo de insetos.

Com tudo isto, e também com a minha vontade de querer lançar um projeto empresarial meu, surgiu a pergunta – Porque não? E a partir daí iniciei na minha garagem, uma pequena produção de Tenebrio molitor, tentando desta forma criar insetos para serem incorporados nas ideias que tinha para futuros produtos alimentares.

A: Como tem sido o desenvolvimento dos produtos? Que dificuldades sentiram/ têm sentido?

GP: Numa fase inicial a Portugal Bugs nasceu na minha garagem, num pequeno compartimento onde se tentou entender as condições ideias para se criar Tenebrio molitorpara ser utilizado para alimentação humana.

Felizmente e devido ao grande apoio ao empreendedorismo existente em Portugal, a nossa startup conseguiu mudar-se para umas instalações melhores no final do mês de fevereiro, conseguindo aumentar a sua produção de forma a entender quais os desafios para a industrialização da sua produção.

Embora neste momento ainda não seja autorizada a colocação de produtos alimentares com incorporação de insetos no mercado a nível europeu devido ao novo regulamento dos Novel Foods que entrou em vigor a 1 de janeiro de 2018, a Portugal Bugs tem procurado esclarecer-se com as entidades competentes de forma a entender como acelerar o processo de autorização. No entanto, de momento teremos de aguardar que os dossiers de aprovação entregues à EFSA sejam aceites.

Contudo, encontramo-nos a desenvolver diversas formulações de produtos alimentares como barras proteicas, massas, chocolates, pães e bases de pizza.

Recentemente fomos vencedores de um concurso de inovação, nomeadamente o Norte Empreendedor, com a Peanut & Honey Ento Bar, uma barra proteica feita com produtos naturais onde a sua fonte proteica provém da incorporação de farinha de inseto.

A: Como é o processo de fabrico. De onde vêm os insetos? São também produzidos na empresa?

GP: A Peanut & Honey Ento Bar é uma barra proteica feita a partir de produtos naturais, predominando a manteiga de amendoim, mel e a aveia.

Com este produto procuramos colocar à disposição um produto alimentar onde a sua fonte proteica provém de uma farinha de inseto, tentando desta forma desmistificar o preconceito de consumo por parte do consumidor ocidental.

Os nossos produtos são testados com farinhas de diversos insetos como o grilo doméstico (Acheta domesticus), besouro-menor (Alphitobius diapernius) e claro o Tenebrio molitor, sendo apenas este último criado por nós.

O nosso objetivo final, é fazer com que os nossos produtos sejam feitos com incorporação dos insetos criados e processados na Portugal Bugs.

A: Como tem sido a aceitação das pessoas?

GP: Relativamente aos nossos produtos com incorporação de farinha, a experiência que temos tido com algumas degustaçõe, é que os consumidores ficam intrigados pelo facto de não sentirem qualquer tipo de paladar incomum e também por não ser visível o inseto em si, despertando nos mais curiosos, vontade por provar algo mais arrojado.

Relativamente à prova de produtos com insetos visíveis, estivemos recentemente em Coimbra na noite dos exploradores, onde foi feita uma degustação de produtos com insetos e ficamos agradavelmente surpreendidos relativamente à recetividade por parte do consumidor para o consumo de produtos onde os insetos estejam inteiros.

Embora esta experiência tenha tido resultados positivos, é de realçar que ao longo de todos os inquéritos que temos realizado, o consumidor ocidental ainda não se encontra preparado para consumir insetos inteiros e visíveis no produto final.

A: Já têm produtos em comercialização? Onde?

GP: Devido à regulamentação existente na europa referente aos Novel Foods, que no fundo regula todos os produtos que não tenham histórico de consumo dentro da união europeia antes de maio de 1997, não nos é permitido colocar à venda produtos com insetos, sem que tenhamos submetido um dossier que demonstre que este inseto não traz qualquer implicação para a saúde publica.

De momento não estamos a ponderar a submissão de um dossier de forma individual pela Portugal Bugs pois acarreta custos extremamente elevados, e pelo facto de já ter sito submetido por outras entidades, em que numa delas já nos encontramos associados, não faz muito sentido.

Estamos, no entanto, a trabalhar para conseguirmos licenciar a nossa produção, tanto dos insetos, como dos produtos alimentares.

A: Já existe uma associação. Porquê criar uma associação nesta fase? Já tem associados?

GP: No passado dia 18 de maio foi apresentada no INIAV de Santarém, a Portugal Insect – Associação Portuguesa de Produtores e Transformadores de Insetos, criada em parceria com outras duas empresas do setor, a Entogreen e a Nutrix.

A necessidade de se criar uma associação numa fase tão prematura do sector a nível nacional, deve-se ao facto de acreditarmos que em conjunto conseguimos fazer com que o sector cresça e se desenvolva tentando desta forma colocar Portugal na linha da frente relativamente à produção e transformação de insetos.

Dado que a fundação ocorreu no passado dia 18, a Portugal Insect encontra-se precisamente na fase de captação de associados. Para além dos fundadores, conta já com o INIAV como sócio honorário.

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