publicado a: 2015-11-05

Porque é que a fruta não sabe como antigamente?

Colher a fruta antes do tempo para distribuir em grande escala ou melhorá-la geneticamente para modificar a sua aparência física, podem causar o seu declínio organoléptico.

“Ontem trouxeram-me uns tomates de uma pequena horta, que tinham um sabor maravilhoso”. Este é um caso clássico que todos escutámos pelo menos uma vez, um tratamento quase divino dos produtos das pequenas hortas.

Sabor: o que devia ser normal converte-se em extraordinário. Mas, porquê? O que acontece atualmente com as frutas e legumes? Vários aspetos determinam a qualidade dos produtos em circulação. Mas, segundo José Cabrera, da Huerta de Carabaña, podem-se reduzir a cinco: produto de época, variedade adequada, agricultura sustentável e água rica em nutrientes, maturação na árvore e entrega rápida. “Não é que exista fruta e legumes de maior ou menor qualidade, é que há variedades, calibres e pontos de maturação diferentes”, conclui Iván Carrasco, da distribuidora Fru&ver.


Questão de maturação

Pode ser o aspeto mais importante a ter em conta. Neste coincidem agricultores, fruticultores e distribuidores. “O problema está no ponto de maturação. Atualmente a fruta é colhida verde e deixa-se que amadureça em câmaras ou durante o transporte e, como não se faz de forma correta, o sabor depois não é igual.”, diz Lorenzo Ramos, secretário geral da Unión de Pequeños Agricultores e Ganaderos (UPA).

Mas porque é que se colhe verde? Os armazenistas e distribuidores têm que dar resposta a uma grande procura e abastecer pontos distantes. “Para a exportação não se pode colher maduro por causa da viagem e da distância, mas se se vai vender no mesmo país, deveria colher-se em plena maturação, no ponto ótimo, e isto não ocorre”, explica Ramos. “ Não é fácil, mas há que oferecer o produto no ponto de maturação ideal, é trabalho também das fruteiras procurar essas peças entre os distribuidores, amadurecidas nas árvores e não em câmaras”, explica Fernando Vásquez, das Frutas Vásquez Jr.

A época é outro aspeto à qual a qualidade do produto está diretamente relacionada. Aconselha-se sempre a comprar fruta e legumes da época. Se não o é, significa que foi cultivada a muitos quilómetros de distãncia e consequentemente, foi colhida antes do tempo para suportar o transporte e a distribuição.

Muitas marcas afirmam ser amigas do ambiente, de terem culturas sem pesticidas; usando a luta biológica para combater pragas e insetos. Mas é difícil provar que os tratamentos químicos alteraram o sabor. "Ninguém pode deduzir que uma fruta tenha um gosto melhor por ser biológica, explica José Herrero, agrónomo. Mais um aspeto que se tem de ter em consideração é a água utilizada para a irrigação. "Frutas e legumes contêm geralmente entre 70% e 95% deste líquido e é por isso que a água utilizada é fundamental. Nós usamos água de fontes naturais com alta concentração de minerais, com a salinidade certa ", diz Cabrera. "O teor de açúcar das frutas influencia o seu sabor, bem como a água", disse Herrero. Mas, além do tipo de água utilizada, também é afetada pela quantidade e o excesso de rega ou a seca.


Bonitas por fora….e por dentro?

“Atualmente as frutas e legumes primam pelo aspeto. Pedem-nos produtos que sejam todas iguais e de calibre grande”, explicam da UPA. Os agricultores queixam-se que há bastante tempo em Espanha é difícil vender variedades que dêem peças distintas ou, por exemplo, que tenham marcas. “Isto sem falar dos baixos preços que pagam”, acrescenta. Como explicam, lojas e cooperativas, bem como hipermercados e supermercados, são os que em última instância, decidem o que se cultiva. O cozinheiro e agricultor Floren Domezain diz qual a razão: “Perderam-se as variedades autóctones e substituíram-se por híbridos, na busca por mais produção e melhor estética. E impõe-se a industria em estufas que não deixam o sol passar diretamente. Isto afeta o sabor final.” Por isso, mudou o tipo de produto agrícola que se procura e as variedades cultivadas. “As modificações genéticas que têm sido experienciadas nas frutas e legumes, têm procurado principalmente as que permitem obter mais produção, melhor estética e que aguentem a cadeia de distribuição, tudo isso em detrimento da qualidade organoléptica”, resume Cabrera.

Por seu lado, Luis Pacheco, que dirige a mercearia Gold Gourmet, afirma que esta situação está a começar a mudar. Segundo ele, o consumidor tende agora a regressar à mercearia do bairro em busca de um produto com mais sabor e aroma, e não na distribuição massiva (que implica cortar a maturação para o distribuir a tempo) ou a beleza da fruta ou vegetal.


O mistério dos tomates

É um dos produtos que a maioria dos consumidores se queixa: O que acontece com este valioso fruto, fonte de vitaminas e antioxidantes? “O tomate gera uma quantidade significativa de licopeno, um pigmento vegetal vermelho com propriedades antioxidantes, que já não se gera ao ser colhido verde”, explica Cabrera. Não há estudos que liguem o licopeno ao sabor, mas novamente caímos na armadilha de travar a maturação. Há tomates verdes saborosos, claro que sim, mas de variedades específicas. E aí está a chave: a semente que dá lugar a um tipo de tomate e a outro.


Fonte: El País

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