A NASA está realmente a tentar cultivar batatas em Marte
À medida que os humanos se preparam para partir para Marte, continua a questão do que eles comerão uma vez que colonizem o planeta vermelho. Os cientistas que viajaram para o deserto peruano Pampas de La Joya dizem que têm a resposta: batatas.
Investigadores do Centro Internacional da Batata em Lima (Peru) e cientistas da Administração Nacional e Aeronáutica e Espaço estão a estudar que tipo de batata poderia ser mais adequado para a agricultura extraterrestre de forma a apoiar uma ocupação humana em Marte. Se tudo correr como planeado, as colónias de Marte poderão vir a comer batatas.
"Tem que ser uma batata marciana que saiba bem", disse Julio Valdivia-Silva, um astrobiólogo peruano da NASA. "É um grande desafio desenvolver um organismo vivo em outro lugar. Nós nunca fizemos isso antes."
A ideia é literalmente ficção científica, incluída no filme de Hollywood "Perdido em Marte" ("The Martian" na versão original), onde Matt Damon desempenhou o papel de um astronauta e botânico perdido, que planta batatas para sobreviver em Marte.
A “Mars One”, uma fundação holandesa sem fins lucrativos, planeia enviar pessoas para o planeta daqui a cerca de 10 anos, uma viagem só de ida para estabelecer uma colónia permanente. O inventor Elon Musk diz que a sua empresa, “SpaceX” também espera enviar seres humanos dentro de uma década, mas alertou durante uma conferência de startups em Hong Kong em janeiro, que seria “complicado, perigoso e difícil de todas as maneiras que se pode imaginar."
A NASA, que em 2012 conseguiu aterrar o “Curiosity” em Marte, descobriu no ano passado que existem lá fluxos de água e anunciou recentemente planos para enviar astronautas.
“Quando os seres humanos forem a Marte, eles vão querer cultivar coisas. Eles precisam de comida", disse Chris McKay, cientista planetário do Centro de Pesquisa Ames da NASA na Califórnia (EUA) e participante do estudo da batata. "Eu acho que nós vamos ser capazes de encontrar variedades de batatas que crescem em condições de frio e de baixa pressão. Isso seria interessante saber para aplicar em Marte."
A batata é uma importante cultura mundial, graças à sua capacidade de se adaptar a uma variedade de climas e à sua riqueza em hidratos de carbono, proteínas, vitamina C, zinco e ferro. O Peru, local de nascimento do tubérculo, é o lar de mais de 4.500 variedades, mais do que em qualquer outro lugar, de acordo com o Centro Internacional da Batata.
As batatas aqui também têm outra vantagem: Eles não são apenas para comer. As avermelhadas, roxas e amarelas são usadas como corantes. As batatas podem ser utilizadas como bateria. Em terras altas rurais do Peru, uma batata irregular chamadas de "a noiva chorosa”, é dada pela mãe do noivo à noiva para testar quão boa esposa, ela será (tudo depende de quão perfeitamente ela descasca a batata).
Peru é bom para a experiência por causa do deserto Pampas de La Joya, um dos locais mais secos da Terra, que recebe cerca de um milímetro de precipitação por ano. É parte do vasto deserto de Atacama da América do Sul, que tem sido muito estudado pela NASA por causa das suas condições parecidas com Marte, em particular o seu solo.
Para o estudo de batata, os cientistas selecionarem 65 variedades de batatas conhecidas como as mais resistentes.
O primeiro passo será plantar os tubérculos numa grande quantidade de solo transportado a partir deste deserto para Lima. Se eles crescerem com sucesso, as batatas serão então plantadas num simulador que imita as condições atmosféricas de Marte.
Walter Amoros, um cientista peruano no Centro Internacional da Batata, acha que metade das batatas vão crescer no solo do deserto, mas apenas cerca de 10 vão atingir um bom tamanho. O sabor pode mudar por causa do stress, avisou ele, o que é comum na Terra quando as batatas são expostas a secas severas e altas temperaturas. Por vezes torna-se tão amargo que não são comestíveis.
Em Marte, as médias da temperatura são de -29º, com mínimos de -140º, de acordo com a NASA. Tem altos níveis de radiação e aproximadamente 60% menos gravidade que a Terra. A sua atmosfera tem 96% de dióxido de carbono, com apenas uma pequena quantidade de oxigénio. Há também as tempestades de poeira e a água salgada.
As batatas "vão passar por uma prova de fogo. Eu fiz testes sob condições stressantes, mas nunca tão stressantes", disse Amoros. "Acho que elas não vão crescer ao ar livre [em Marte]. Terão que ser plantadas em condições controladas, em cúpulas."
Os primeiros viajantes espaciais basearam-se em comida pastosa espremida de tubos de alumínio. Hoje, os astronautas têm um menu mais apetitoso: frango, carne e até mesmo salmão seco. Sal e pimenta são fornecidos em forma líquida, para os impedir de flutuar para longe. Há café, sumo de laranja e limonada, consumida através de palhinhas.
Os estudos de plantas da NASA estão atualmente concentrados em folhas verdes como alface, que tem sido cultivada pequenas câmaras na estação espacial internacional. Eles também planeiam estudar couve chinesa e tomates. Embora menos nutritivos do que as batatas, os investigadores esperam que os verdes sejam capazes de complementar a dieta dos astronautas durante os voos espaciais.
Os cientistas dizem que o cultivo de alimentos reduzirá custos e mitigará os riscos de transportar os alimentos. "Se algo correr mal, e se puderem ser produzidos alguns dos alimentos no local, então há um meio de subsistência", disse Raymond Wheeler, um fisiólogo de plantas na NASA.
Até o cultivo começar, os cientistas prevêem o transporte de batatas para Marte em tubos refrigerados. Elas poderiam ser plantadas por máquinas num ambiente controlado antes dos humanos chegarem. Se o solo marciano se revelar demasiado hostil, há opções de as cultivar sem solo, por hidroponia e aeroponia, que fornecem nutrientes através da água e do ar, respetivamente.
Continuarão a necessitar de fertilizantes, situação que os cientistas dizem que pode ser resolvida em Marte através da reciclagem de nutrientes de urina e partes de plantas não comestíveis. "Isto será importante para alcançar sistemas do tipo sustentável", disse Wheeler, "independentemente da abordagem."
Fonte: The Wall Street Journal