publicado a: 2018-12-12

Novas perspetivas para a alfarrobeira

Face aos cenários prováveis de alterações climáticas no mediterrâneo (subida de temperatura e diminuição da precipitação) é importante reaprender e reavaliar as espécies cultivadas mais tradicionais, que desde sempre foram confrontadas com variações do clima mais ou menos acentuadas. Uma dessas culturas é a alfarrobeira (Ceratonia siliqua L.), amplamente cultivada e explorada no sul do país.

Toda a produção de fruto (a alfarroba) é processada industrialmente na região do Algarve. Existe assim uma capacidade instalada que assegura quer a primeira transformação (separação da polpa e semente), quer a segunda transformação (produção da farinha de semente ou “locust bean gum”). Este último produto é um aditivo alimentar altamente valorizado no mercado internacional dos hidrocolóides sendo utilizado como espessante e estabilizante na industria alimentar, cosméticos, etc. Para além da semente (grainha), a polpa da alfarroba, que representa cerca de 90% de peso do fruto, tem vindo a ser (re)descoberta e valorizada. Assim, a polpa de alfarroba é um reservatório rico em açucares e com uma grande variedade de polifenós com interesse farmacêutico e nutracêutico.

Garantir a produtividade e um bom desenvolvimento das árvores e dos pomares deve ser um dos objetivos principais dos produtores que podem tirar partido da elevada capacidade da alfarrobeira em adaptar-se a vários ambientes edáficos e climáticos. Existem atualmente vários procedimentos adotados por alguns produtores que contribuem para reduzir o período improdutivo dos pomares. A utilização de árvores já enxertadas de viveiro, maiores densidades por ha e a rega localizada nos primeiros 2-3 anos de plantação são pontos definitivamente aceites pelos novos produtores. Em relação às necessidades hídricas, e numa perspetiva de escassez deste recurso, a alfarrobeira pode ser facilmente gerida em modo de sequeiro ajudado, desde que a precipitação no ano hidrológico não seja inferior a 350 mm.

Independentemente de a alfarrobeira ser particularmente eficiente na utilização da água e dos nutrientes, especial atenção deve ser dada à fertilização, visto que grande parte dos solos ocupados pela cultura são pobres em matéria orgânica. Em relação ao solo mais adequado, a alfarrobeira pode ser cultivada em diferentes tipos de solo, desde que não seja sujeita a períodos prolongados de encharcamento. Além disso, está também adaptada aos solos com elevado teor de calcário ativo, sem apresentar sintomas de desequilíbrios nutricionais nos micronutrientes, em particular o ferro.

Apesar dos pontos fortes já mencionados, a cultura apresenta alguns constrangimentos. A produção de alfarroba é bastante irregular entre anos, chegando a ter uma alternância bastante marcada, e os preços do fruto no mercado regional são cronicamente muito baixos. Se o investimento na investigação nos aspetos agronómicos deva ser reforçado, novas perspetivas devem ser exploradas de modo a garantir a sustentabilidade da cultura a longo prazo. É o caso do sequestro de carbono como serviço do ecossistema. A alfarrobeira é uma espécie de folha perene e de elevada longevidade e que é explorada em diferentes tipos de agrossistemas. A sua capacidade de funcionar como stock de carbono, rentabilizando as zonas de solos marginais, poderia complementar os retornos económicos dos produtores e compensar os anos de baixas produções.

Pedro José Correia
Universidade do Algarve

Publicado na Voz do Campo n.º 217 (julho 2018)

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