Plano de apoio a quem não plantar eucaliptos chega a Monchique
Depois de ter arrancado no Tejo Internacional e na Serra do Açor, o programa de dois milhões de euros começa em Monchique. Objectivo é dar prioridade às espécies autóctones para construir um território resistente ao fogo sem esquecer rendimentos das populações.
A questão é antiga: como exigir aos poucos que ainda se mantêm pelo interior que façam nos seus terrenos algo que beneficia todos mas quase nada os próprios? A resposta soa simples: pagando-lhes pelos serviços que prestam à comunidade. Mas apesar de tudo parecer óbvio, nada ou pouco em Portugal se fez neste sentido. Agora, há a promessa e dinheiro no Orçamento do Estado: são mais de dois milhões de euros para recompensar quem no Tejo Internacional e Serra do Açor - e a partir de agora também na Serra de Monchique - optar por plantar espécies autóctones, abdicando do rápido rendimento que o eucalipto proporciona.
O caminho é defendido por muitos, há já muito tempo. Conhecido como “pagamento dos serviços do ecossistema”, na prática o que se pretende é recompensar aqueles que se mantêm nos territórios rurais e que com a sua actividade, seja florestal, agrícola ou pastorícia, contribuem para paisagens com elevado valor natural, paisagístico e resilientes ao fogo. Que potenciam a defesa do solo e a qualidade da água e do ar. Falta aqui a parte fundamental: que também seja rentável.
Ora, como exigir que se plantem espécies autóctones, por exemplo, cujo rendimento só chega na geração seguinte, quando o eucalipto lhes dá um retorno garantido em pouco tempo? Quem os compensa por isso?
Para tentar dar esta resposta, o Ministério do Ambiente lançou dois projectos-piloto, anunciados em Julho, para os parques naturais do Tejo Internacional e da Serra do Açor, para o qual inscreveu cerca de um milhão e meio de euros no orçamento do próximo ano, como anunciou o ministro ao PÚBLICO em Outubro. A intenção é começar a recompensar quem arrancar eucaliptal para plantar espécies autóctones, adianta ao PÚBLICO Célia Ramos, secretária de Estado do Ordenamento do Território e da Conservação da Natureza. Com a destruição que ocorreu este ano em Monchique, a serra algarvia é a região que se segue nesta estratégia, cujo programa será divulgado nesta quarta-feira, na câmara local.
"Uma paisagem resiliente"
“Temos de desenhar uma paisagem resiliente, produtiva e com capital natural”, explica a governante, justificando assim o pagamento aos que são os verdadeiros obreiros desta construção: as – poucas – populações que ainda resistem nas zonas do interior. Porque, além de ambiental e até de protecção civil, “esta é também uma questão de coesão do território”, sublinha.
Assim, no Tejo Internacional, o ministério juntou habitantes, proprietários, empresas e autarquias para pôr em marcha um plano para arrancar eucalipto e plantar azinho e sobro. Tudo para voltar a ter espécies autóctones nestes territórios. No Açor, a ambição foi maior, disse a governante. Além da promoção da biodiversidade, pensou-se na água, nos incêndios e na paisagem, voltando-se a apostar numa floresta sem espécies “estrangeiras” como o eucalipto. Em Monchique – que não é um parque natural mas faz parte da Rede Natura 2000 -, o leque dos serviços dos ecossistemas abrangidos pelo projecto será alargado, incluindo também o solo.
É um trabalho moroso e ainda ninguém sabe quanto custa pagar estes serviços. No Tejo Internacional e na Serra do Açor já se está no terreno a ver cadastros, a tentar reunir proprietários e a tentar chegar a um consenso sobre o tipo e duração dos contratos – algo que dependerá do retorno económico das espécies, afirma Célia Ramos. Assim como dos serviços que forem pagos – biodiversidade, defesa contra incêndios, água, sol, ar e serviços culturais, que é como quem diz o bem-estar fornecido pela paisagem.
E a gestão florestal?
Mas porquê o foco no eucalipto quando se sabe que o problema dos incêndios não está tanto na espécie mas mais na gestão florestal – ou a falta dela – e nos matos, que é o que mais arde? Porque este não é um projecto para todo o território mas “sim para as áreas protegidas, onde o que temos de proteger são os habitats naturais que levaram à sua classificação, contendo as espécies exóticas”, responde a governante.