Prós e contra da chuva de maio. Mais pastagens mas pior produção
O adágio falhou neste ano e abril não foi de águas mil. A chuva chegou em força apenas na primeira quinzena de maio sem dar tréguas ao longo de duas semanas, deixando os agricultores à beira de um ataque de nervos. Que o digam os produtores de cereja do Fundão, a braços com a fruta rachada ainda nas árvores, ou os colegas do vale do Tejo que já tinham lançado à terra as sementeiras de tomate, milho e arroz, assistindo agora à morte das plantas por asfixia, enquanto a uva de Santarém é atacada pelo míldio. E a chuva está ainda longe de responder às necessidades das barragens. As boas notícias do ano agrícola centram-se nas pastagens e cereais de sequeiro.
De um atraso de três semanas na campanha já a cereja do Fundão não se livra, mas o pior para os produtores são os prejuízos. "O fruto rachou por causa deste frio e da chuva intensa dos últimos dias", explica José Branco, produtor e presidente da Cerfundão, empresa de embalamento e comercialização de cereja, que neste ano até fez novos investimentos, estando longe de imaginar que não iria ter cerejas para tanta encomenda oriunda do Brasil, França, Inglaterra ou Emirados Árabes.
"Há variedades - sobretudo, as mais precoces - em que as perdas poderão ser totais. Depois há quebras na ordem dos 80%", segundo o mesmo dirigente. A produção de cereja na região atinge uma média anual de seis mil toneladas, representando cerca de 20 milhões de euros para economia do Fundão, segundo estima a própria autarquia
Já as vinhas do Ribatejo debatem-se com o ataque do míldio, o temido fungo que surge à boleia da conjugação entre a chuva e as temperaturas relativamente altas, capaz de causar grandes prejuízos nas culturas. "Temos os nossos produtores num ataque constante ao fungo e esperamos que não chova nos próximos dias", diz João Silvestre, diretor-geral da Comissão Vitivinícola Regional do Tejo, revelando que, afinal, ainda não há prejuízos para a uva da região.
Para hoje, espera-se o regresso do bom tempo, com a uma subida da temperatura até 25 graus Celsius no Algarve e no Alentejo. O sol vai brilhar no país até terça-feira, mas na quarta-feira podem regressar os aguaceiros.
Barragens ainda não estão cheias
Temeu-se o pior nesta semana, perante as cheias no Tejo e ameaças de descargas das barragens. "Estamos em alerta, mas se não chover nesta semana penso que podemos pensar numa produção normal", avança João Silvestre.
No vale do Tejo há agricultores que tentam salvar culturas com recurso a bombas para retirar água das sementeiras de tomate, milho e arroz. "A chuva atrasou um mês e deu cabo de tudo", diz Luís Mira, secretário-geral da Confederação dos Agricultores de Portugal, denunciando que as plantas morrem por asfixia radicular e "já estão a boiar", enquanto no Alentejo há atrasos na plantação de tomate e milho, segundo o agricultor de Elvas Miguel Mendes.
Mas a chuva também levou boas notícias às pastagens desta região, com "mais erva verde durante alguns dias, que irá beneficiar a pecuária", sublinha o produtor, admitindo que os cereais de outono-inverno, como trigo e cevada, beneficiaram com o enchimento do grão, embora algumas searas "já tenham caído devido ao excesso de água".
Luís Mira não exclui a possibilidade de os agricultores alentejanos ainda virem a ser afetados pela seca neste verão, avisando que a chuva dos últimos dias não se traduziu em recuperação das barragens mais a sul. "Houve zonas em que a chuva caiu mais 200% do que o normal, mas há locais do Alentejo em que ficou a 30%, deixando as albufeiras com pouca água", diz.
A Agência Portuguesa do Ambiente (APA) confirma a existência de barragens abaixo dos 50% da capacidade de armazenamento, como Beliche (43%), Monte Novo (46,6%) e Vigia (48%), enquanto o otimismo é maior em torno de Abrilongo (53,1%), Alqueva (78,3%), Caia (62%) e Odeleite (50,9%). Por bacia hidrográfica os valores de final de abril apresentavam-se superiores às médias de armazenamento de abril (1990-91 a 2014-15), exceto para as bacias das ribeiras do Oeste, Sado, Guadiana, Mira, ribeiros do Algarve e Arade.
Fonte: Diário de Notícias