Quebra na produção do azeite potencia o furto de azeitona e a exploração de pessoas
Ao longo das últimas semanas e à medida que a campanha de apanha de azeitona decresce de intensidade, brigadas da GNR envolvidas na operação “Operação Azeitona Segura” apreenderam 14 toneladas de azeitona furtada, adiantou ao PÚBLICO o tenente-coronel Joaquim Figueiredo comandante do Comando Territorial de Beja. A redução da época da colheita frustrou as expectativas dos engajadores de mão-de-obra, que agora vêem no furto e na exploração dos trabalhadores uma forma de compensação financeira.
O militar da GNR adiantou que no decorrer da operação, foram identificados 39 indivíduos suspeitos mas só quatro é que foram detidos porque os proprietários das explorações onde ocorreram os furtos “não quiseram apresentar queixa”. Um dos empresários vítima de furto, de nacionalidade espanhola, justificou a sua recusa em apresentar queixa com a carga burocrática que as autoridades portuguesas impõem a quem recorre para a Justiça.
Numa das suas intervenções mais recentes, uma brigada da GNR deteve 15 suspeitos que transportavam em quatro viaturas 2500 quilos de azeitona furtada na zona de Baleizão, concelho de Beja. Na sua maioria eram homens, com idades entre os 14 e 38 anos, mas também havia crianças e eram todos cidadãos romenos que se faziam transportar em veículos de matrícula espanhola.
A azeitona furtada, com maior incidência nos concelhos de Serpa e Moura, é depois vendida em Espanha a “receptadores que se concentram na localidade de Rosal de la Frontera”, junto à fronteira com Portugal, afirmou o empresário agrícola António Barradas.
“Este ano, os furtos notam-se mais porque o trabalho (apanha de azeitona) acabou mais cedo” e os cidadãos romenos que são engajados por indivíduos da mesma nacionalidade não conseguiram ganhar o dinheiro que esperavam, adianta o proprietário agrícola.
O impacto desta actividade à margem da lei reflecte-se também “nos danos provocados nas oliveiras”, assinala o comandante da GNR de Beja, frisando que há casos em que as árvores são sujeitas a processos de varejamento que danificam a ramada e podem afectar a produção no próximo ano.
O deputado do PSD, Mário Simões, já analisou com Joaquim Figueiredo o problema dos roubos da azeitona, realçando o “elevado número de participações” e as consequências dos furtos na economia das explorações e o grupo parlamentar do PCP endereçou ao Ministério da Administração Interna um pedido de esclarecimento sobre as acções que pensa tomar para travar a “ocorrência de roubos de azeitona".
Os comunistas precisam que os olivicultores “dão conta dos roubos da azeitona quando iniciam o seu dia de trabalho”, admitindo que estas acções possam ocorrer durante a noite, o que vem “agravar a situação de rentabilidade das explorações” num ano já de si difícil por causa da doença que afectou a produção.
Para além do prejuízo económico, os furtos têm associado um outro problema: a maior parte da azeitona é recolhida do chão, expediente que vai afectar, inevitavelmente a qualidade do azeite que “vai ser péssima”, antecipa António Barradas. Desta forma, o mercado paralelo da produção olivícola assume maior dimensão. Acresce para este facto a elevada quebra (quase 60%) da produção na região espanhola de Andaluzia, onde é produzido quase metade do azeite a nível mundial, como descreve a Oil World, organismo internacional que fornece informações sobre óleos, produtos oleaginosos e gorduras.
Tal como em Portugal as razões desta quebra são imputadas ao clima: as baixas temperaturas e excessivas chuvas estivais em 2014 conduziram a uma infestação anormal de moscas que afectaram a quantidade e a qualidade do azeite.
No último Outono, João Machado, presidente da Confederação dos Agricultores Portugueses, já advertia que a produção estava a ser afectada pela praga da mosca da azeitona, admitindo que o “ano não seria bom para a produção de azeite”.
Estes condicionalismos reflectiram-se no encurtamento da campanhas de recolha de azeitona e, consequentemente, na menor necessidade de mão-de-obra. Como os engajadores romenos não tiveram o retorno financeiro esperado, “forçam agora os que engajaram a envolverem-se no furto de azeitona para compensar os ganhos”, prolongando um problema social que começou com o tráfico de pessoas na Roménia para trabalhar no Alentejo, alerta António Barradas.
O comandante da GNR de Beja acrescenta ainda a exploração desumana de pessoas, que “até crianças envolve”, garantindo que a intervenção das forças sob o seu comando vai prosseguir.
Fonte: Público