publicado a: 2019-10-04

Queijos, frutas e marisco: novas taxas aduaneiras dos EUA afectam produtos portugueses

Estados Unidos vão aplicar direitos aduaneiros autorizados pela Organização Mundial de Comércio a partir de 18 de Outubro. Taxas são retaliação às ajudas públicas da União Europeia à Airbus.

Os Estados Unidos anunciaram nesta quarta-feira que vão impor taxas alfandegárias sobre produtos da União Europeia, incluindo aeronaves, a partir de 18 de Outubro, medida que surge após uma decisão favorável da Organização Mundial de Comércio (OMC). As novas taxas, de 10% e 25%, também afectam produtos portugueses. Segundo a lista divulgada pelo Gabinete de Comércio Internacional dos EUA, queijos, carne de porco, derivados de leite como iogurtes e manteigas, frutas como cereja, limões e pêssegos e diferentes tipos de moluscos oriundos de Portugal vão ser sujeitos a uma taxa adicional de 25% quando importados pelos EUA. A lista também exclui o vinho português, que era uma das possibilidades referidas quando no início de Abril se falou do agravamento de taxas. A lista inicial valia 21 mil milhões de dólares (19,1 mil milhões de euros), mas a versão final ronda os 6000 milhões de euros, ficando isentos produtos como helicópteros, peixe (excepto marisco), lençóis, metais, carteiras, entre outros.

As azeitonas e o azeite português ficam isentos deste agravamento, ao contrário da azeitona e do azeite (refinado) com origem em Espanha – a federação de agricultores e criadores de gado em Espanha (COAG) calcula que o prejuízo total destas taxas sobre a economia espanhola possa rondar os mil milhões de euros, diz a Reuters. Os EUA são o maior mercado estrangeiro fora da UE para o sector agrícola espanhol, que exporta vinho, azeite, queijo e azeitona. “É completamente injusto que a comunidade rural tenha de pagar a factura de uma guerra comercial com a União Europeia que nada tem a ver com as províncias espanholas”, reage o presidente da COAG, em tom indignado.

O presidente da Confederação de Agricultores de Portugal, lamenta em declarações ao PÚBLICO, que a relação dos EUA e da UE esteja a ser prejudicada pela falta de um acordo como o TTIP que sirva para regular o comércio entre os dois blocos. Eduardo Oliveira e Sousa salienta que esta recente decisão de Washington significa que a reacção norte-americana face a problemas num sector que “nada tem a ver com os agricultores, que é o da aviação, vai prejudicar os produtores europeus, incluindo os do sul da Europa”.

Por parte da Fenalac – Federação Nacional das Cooperativas de Produtores de Leite, o director-geral, Fernando Cardoso, diz que este tema está na agenda de uma reunião que decorre nesta quinta-feira em Bruxelas. Salienta que Portugal não exporta leite para os EUA e admite que será necessário analisar quais os derivados do leite de produção portuguesa que estão em causa.

É sabido que os queijos açorianos são um dos lacticínios com mais saída para o mercado norte-americano. Em Itália, os produtores do parmesão estão furiosos. “A Itália, que nada tem a ver com o consórcio Airbus, vê-se obrigada a sustentar uma factura que não tem sentido”, responde Nicola Bertinelli, presidente do consórcio Parmigiano Reggiano. O quilo de queijo desta região custa 40 dólares actualmente nos EUA, que é o segundo maior mercado de exportação, com 10 mil toneladas anuais. A partir de 18 de Outubro, passará para os 45 dólares. A lavoura italiana calcula que as taxas incidirão sobre produtos no valor de 500 milhões de euros. Tal como Portugal, os vinhos e o azeite italiano foram poupados.

O mercado de acções europeu abriu o dia em baixa, um dia depois do pior desempenho diário desde Dezembro, mas as perdas acabaram por ser estancadas quando se soube que a lista de produtos europeus sujeitos a taxas acrescidas tinha sido reduzida. Já as acções da Airbus subiram 3,5% no início da manha, após uma quebra de 2% na quarta-feira, depois de se saber que a lista dos EUA deixava de fora alguns componentes de aviões fabricados por este consórcio europeu da aviação.

O Governo norte-americano tenciona impor taxas adicionais de 10% sobre aeronaves dos países da União Europeia e 25% sobre “outros produtos”, disse um funcionário dos Serviços de Representação Comercial dos EUA. Em causa estão vinhos franceses, uísque da Escócia e da Irlanda bem como diversos queijos europeus, especifica por seu turno a Reuters. Igualmente visadas são ferramentas europeias, noticia o Wall Street Journal.

O presidente-executivo da Airbus reagiu ao anúncio com preocupação, assinalando que esta medida vai elevar os custos para as transportadoras dos dois lados do Atlântico e que pode afectar uma cadeia de abastecimento, em que trabalham 275 mil pessoas só nos EUA. “Esperamos por isso que os EUA e a UE cheguem a uma solução negociada”, afirma Guillaume Faury, num comunicado.

A própria aviação norte-americana teme consequências negativas. “Impor taxas aduaneiras sobre aviões que as empresas dos EUA já encomendaram vai infligir danos sérios sobre as transportadoras dos EUA, os milhões de norte-americanos que trabalham nesta indústria e sobre os passageiros”, assinala por seu lado a gestão da Delta Air Lines, citada pela imprensa norte-americana.

Braço-de-ferro com 15 anos

A OMC autorizou nesta quarta-feira que os EUA apliquem taxas alfandegárias de 7500 milhões de dólares (quase sete mil milhões de euros) sobre produtos europeus, para compensar as ajudas da União Europeia à fabricante Airbus.

Na sequência desta decisão, a Comissão Europeia disse esperar que os Estados Unidos não imponham taxas alfandegárias “contraproducentes”, garantindo que responderá à altura.

Em causa está uma disputa de quase 15 anos entre a UE e os Estados Unidos relativa aos apoios públicos às respectivas fabricantes aeronáuticas, Airbus e Boeing.

Para a OMC, o valor agora determinado é “proporcional ao grau e à natureza dos efeitos adversos determinados entre o período de referência de 2011-2013”, ou seja, dos apoios europeus dados à Airbus nesta altura.

A OMC tem sido palco de uma disputa entre a Boeing e a Airbus, devido às subvenções e ajudas concedidas, respectivamente pelos Estados Unidos e pela UE.

No final de Março deste ano, a OMC concluiu que os Estados Unidos violaram regras comerciais com apoios ilegais à fabricante Boeing, prejudicando a Airbus. Washington ameaçou reagir com aumentos nas taxas alfandegárias sobre produtos europeus, incluindo a Airbus, devido à ajuda pública europeia recebida pelo fabricante europeu.

Esta retaliação da administração norte-americana foi agora autorizada pela OMC, sendo a maior de sempre permitida por esta entidade. Sediada em Genebra, na Suíça, a OMC tem como função mediar as relações comerciais no mundo.

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