WWF Portugal alerta que estratégia “Água que une” vai desviar da estratégia europeia

Em resposta à apresentação da “Estratégia Água que Une” feita recentemente pelo Governo português, a WWF Portugal alerta para uma “estratégia nacional de investimentos megalómana e apressada, sem o devido respaldo e acordo prévio de outros partidos, dos municípios afetados e das organizações da sociedade civil.” Esta estratégia está também em contraciclo com a estratégia da UE que visa assegurar uma maior conectividade, “25 000 km de rios de curso natural até 2030”, nomeadamente, eliminando barreiras fluviais obsoletas de acordo com o Regulamento Europeu do Restauro da Natureza”.
Para Catarina Grilo, diretora de Conservação e Políticas na ONG ambiental, “esta é uma estratégia que se pretendia estruturante, que exige um consenso alargado e um compromisso de longo prazo, algo que não está garantido. No atual contexto geopolítico e económico, onde outros investimentos públicos são essenciais, como a redução de perdas na rede, permanecem sem financiamento assegurado, esta decisão parece irresponsável. A situação torna-se ainda mais grave quando se verifica que apenas 2 mil milhões de euros estão supostamente disponíveis, e mesmo esse montante não está garantido”.
Para esta ONG, apesar da auscultação da sociedade civil e dos diversos setores sociais e de atividade, as principais recomendações acolhidas parecem favorecer, sobretudo, a expansão da agricultura intensiva. A concentração do investimento nas infraestruturas de regadio sugere uma aposta desproporcional e que desconsidera os impactos sociais e ambientais dessa opção e os riscos económicos inerentes. Além disso, a WWF Portugal alerta que a diversificação agrícola e o incentivo a culturas mais eficientes em termos de consumo de água, alinhadas com as condições ambientais locais, como culturas tradicionais ou sustentáveis, são uma alternativa mais viável e adaptada, traduzindo-se uma agricultura mais equilibrada e resiliente.
Adicionalmente, a organização de conservação de natureza considera alarmante que o Governo esteja a propor um pacote de investimentos de 5 mil milhões de euros sem garantir a viabilidade financeira deste plano. Manuela Oliveira, Coordenadora de Água, alerta: “O caso da barragem do Pisão já demonstrou que a União Europeia não irá financiar novas grandes barragens, colocando ênfase na necessidade dos estados membros de libertarem os seus rios de barreiras obsoletas, algo que Portugal não tem vindo a realizar, encontrando-se muito aquém, por exemplo, da vizinha Espanha”. A WWF Portugal enfatiza que existem alternativas mais sustentáveis e de baixo custo, como o restauro de zonas húmidas, proteção de aquíferos e o uso de tecnologias de armazenamento alternativas, como reservatórios naturais ou infiltração de água no solo. Essas soluções não só reduzem o impacto ambiental, como também contribuem para a conservação dos ecossistemas e para a sustentabilidade a longo prazo dos recursos hídricos.
Por fim, esta Estratégia inverte a hierarquia das prioridades definidas pelo diploma legal que criou o próprio Grupo de Trabalho responsável pela sua elaboração. A aposta excessiva nas chamadas infra estruturas cinzentas e noutras opções económica, social e ambientalmente irresponsáveis, contraria os princípios de desenvolvimento sustentável e uma gestão equilibrada dos investimentos públicos.
Diante deste cenário, a ONG apela a que a mesma seja revista o mais rapidamente possível de forma a corrigir as suas fragilidades, suportando-se de eficientes respostas às necessidades sociais (e não apenas económicas) de uma gestão da água. A estratégia deve refletir um verdadeiro compromisso com a sustentabilidade, incentivando uma cultura de conservação e uso responsável da água. O futuro do país não pode ser hipotecado por decisões apressadas e que colocam em risco o nosso bem mais precioso - a Natureza.